Ex-cobrador de ônibus se forma em Medicina na UnB e é exemplo de perseverança e superação

Na noite de sexta-feira (24), o ex-cobrador de ônibus Gilberto Arruda, de 49 anos, emocionou a todos ao subir ao palco do Centro Comunitário Athos Bulcão da Universidade de Brasília (UnB) para receber seu diploma de médico. Sua formatura no curso mais disputado da UnB é um verdadeiro exemplo de superação, mostrando como o ser humano pode moldar sua própria história. Conheça a seguir essa incrível trajetória de vida.

Gilberto Arruda Rodrigues nasceu em Taguatinga e cresceu em Ceilândia, uma região marcada por desafios. De uma família com seis irmãos, ele enfrentou dificuldades financeiras e a perda precoce dos pais: a mãe, aos nove anos, e o pai, aos 18. Apesar disso, ele decidiu seguir um caminho diferente: “Eu não quero isso para mim. Quero outro estilo de vida”, pensou, focando na educação e trabalhando para ajudar no sustento da família.

A ocupação que mais marcou sua trajetória foi a de cobrador de ônibus, um trabalho ao qual se dedicou por seis anos, incentivado pelo pai, que era motorista de transporte público. “Eu passava na UnB e pensava que isso aqui não era para mim, pelo menos por enquanto, e para conseguir pagar uma faculdade particular, teria que arrumar um emprego melhor”, relembra. Ele tentou ascender ao cargo de motorista, mas sofreu um acidente de trabalho que interrompeu seus planos, custando-lhe parte do movimento das pernas. “Naquele momento, a esperança que eu tinha de trabalhar e fazer faculdade acabou”, recorda.

Mas Gilberto não desistiu. Após uma longa recuperação do acidente, ele deu a volta por cima. Casou-se, teve três filhos e, em 2013, concluiu um curso técnico de eletromecânica no Instituto Federal de Brasília (IFB). Ele chegou a ingressar em engenharia eletrônica na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), mas decidiu voltar para Brasília. “Eu recebi uma carta da Uniceplac para fazer medicina com 50% de desconto pelo Fies… não tem jeito, é medicina mesmo”, descreve, lembrando dos sinais que o levaram a essa decisão.

Em 2017, após enfrentar mais um desafio pessoal com a separação da esposa, Gilberto foi surpreendido com a aprovação para medicina pelo Enem. “Resolvi olhar por incentivo da minha cunhada e, para minha surpresa, descobri que tinha passado na UnB. Fiquei muito contente, pois ali seria um novo recomeço”, diz.

Durante o curso, ele teve que se adaptar a uma nova rotina, enfrentando dificuldades com o sono e o deslocamento, mas seus filhos e amigos o incentivaram a continuar. “Quando dizia que estava muito difícil, meu filho, de 10 anos, me falava para não desistir do meu sonho”, relata. O apoio da universidade foi essencial, com auxílios em relação à alimentação, moradia e compra de equipamentos.

Gilberto enfrentou preconceitos e se sentiu invisível no ambiente acadêmico, mas encontrou força nos ensinamentos de seu pai e no apoio de professores e amigos. “Meu pai dizia que não se deve fazer distinção entre as pessoas… ele fazia amizade com todo mundo, então, eu peguei isso dele”, conta. Um de seus professores o incentivou prometendo-lhe um livro como prêmio se estudasse até o quarto período.

Agora formado, Gilberto pretende se especializar em medicina legal ou medicina familiar, áreas que mais lhe chamaram a atenção durante a graduação. Ele acredita que as dificuldades que enfrentou revelaram seu verdadeiro potencial. “Nunca ache que as coisas são impossíveis e tenha orgulho de si mesmo, porque, se você não tem, outras pessoas não vão ter”, aconselha.

Gilberto também reflete sobre a importância da coletividade e do apoio mútuo, usando como exemplo a mobilização em torno da crise climática no Rio Grande do Sul. “O que as pessoas estão fazendo é um show de humanidade”, disse, emocionado.

(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)