A cassação de uma das mais altas honrarias do Exército pode se tornar mais um capítulo da crise política que envolve Jair Bolsonaro. Caso o ex-presidente perca posto e patente após decisão da Justiça Militar, caberá ao presidente Lula (PT) assinar a ordem que retira de Bolsonaro a medalha Ordem do Pacificador, condecoração que ele chegou a exibir a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) durante seu interrogatório no julgamento da chamada trama golpista.
Bolsonaro já foi condenado pelo STF a 27 anos de prisão. A legislação militar prevê que qualquer oficial que receba pena superior a dois anos perde automaticamente suas funções e, com isso, as honrarias recebidas. A decisão final sobre a perda de patente cabe ao Superior Tribunal Militar (STM). Confirmada a punição, a cassação da medalha será apenas uma consequência automática.
Base legal para a cassação
O ato é regulado pelo artigo 10 do decreto nº 4.207, de abril de 2002, assinado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. A norma não deixa espaço para escolhas políticas: uma vez declarada a indignidade do militar, a cassação da condecoração deve ser formalizada pelo chefe do Executivo. Nesse caso, Lula apenas ratificaria a determinação legal.
Como Bolsonaro recebeu a honraria
A Ordem do Pacificador foi concedida a Bolsonaro em meio a controvérsias. O ex-presidente conseguiu a medalha com apoio do general Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, em um momento em que respondia a um processo por racismo movido pela cantora Preta Gil.
À época, Bolsonaro argumentou que havia salvo a vida de um soldado negro durante um treinamento militar nos anos 1970, o que, segundo ele, provava não ser racista. O general Enzo, então comandante do Exército, abriu sindicância, mas resistiu a conceder a medalha por considerar a manobra uma interferência política. Apenas anos depois, já sob o comando do general Eduardo Villas Bôas, a honraria foi entregue a Bolsonaro.
Impacto político e militar
Caso a cassação se confirme, o episódio terá forte repercussão simbólica. Para juristas, a perda da medalha reforçaria a gravidade das condenações impostas ao ex-presidente, representando não apenas sanções judiciais e políticas, mas também a perda de reconhecimento institucional dentro das Forças Armadas.
O tema também reacende o debate sobre a relação entre política e condecorações militares. Para críticos, a história da medalha concedida a Bolsonaro ilustra como instrumentos de prestígio das Forças Armadas podem ser usados em disputas políticas.
De outro lado, aliados do ex-presidente já alegam perseguição e argumentam que a medida seria apenas mais uma tentativa de desgastar sua imagem. Especialistas em direito constitucional e militar, no entanto, afirmam que a cassação está prevista em lei e independe de vontade política.
O peso da decisão
Ainda que o ato seja considerado meramente formal, a assinatura de Lula trará peso político inevitável. Isso porque consolidará a perda de uma honraria militar por parte de um ex-presidente que fez da ligação com as Forças Armadas uma de suas principais marcas.
Assim, um decreto assinado por Fernando Henrique Cardoso em 2002 pode, duas décadas depois, obrigar Lula a cumprir um procedimento que afetará diretamente o legado de Bolsonaro — condenado em um processo relatado por ministro indicado por Michel Temer, em um julgamento que só foi possível após o impeachment de Dilma Rousseff.
Detalhe: Bolsonaro votou pela deposição da então presidente e dedicou seu voto a um torturador da ditadura militar, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra.
Da Redação com informações g1
Foto: Fellipe Sampaio/STF/Arte g1
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